segunda-feira, 4 de abril de 2011

Benghazi, capital dos insurgentes líbios, busca uma difícil serenidade

Le Monde
Nicolas Bourcier
Enviado especial a Benghazi (Líbia)
  • Rebelde líbio faz guarda durante as orações de sexta-feira, na cidade de Benghazi, na Líbia 

  • Rebelde líbio faz guarda durante as orações de sexta-feira, na cidade de Benghazi, na Líbia


    • Sete semanas após o início da revolução, Benghazi vive no ritmo das incertezas do front. E está se esgotando. Em um clima de insegurança e de paranoia, a capital da oposição líbia está suspensa em um instável equilíbrio, entre a esperança e o desânimo, o medo e a dúvida.
      Ainda no domingo (3), diante de uma multidão de jornalistas, um dos porta-vozes do movimento de libertação anunciou pela enésima vez a retomada da cidade costeira de Brega, 170 quilômetros mais a oeste. Uma notícia desmentida no minuto seguinte ao final da conferência, longe dos microfones, por um membro do conselho local dos rebeldes, que acabara de voltar das linhas de frente. Como se Benghazi estivesse buscando a qualquer preço comemorar vitórias que não aconteceram. Sem que ninguém critique.
      Deve ser dito que a cidade foi salva pelo gongo. O avanço dos tanques do coronel Gaddafi pelas portas de Benghazi, no dia 18 de março, alastrou o medo. Salva no último momento pelos ataques aéreos ocidentais, ela vem se reerguendo aos poucos. Os rumores de atrocidades cometidas pelos déspotas do regime, que insurgentes têm transmitido pelo rádio, não ajudam na recuperação de um semblante de serenidade. A recente descoberta de uma lista de 8 mil pessoas residentes em Benghazi e que teriam sido agentes do Líder líbio também tem dado o que falar. Algumas delas teriam sido presas pelos chabab (jovens) em suas casas, e teria havido acertos de contas.
      Há dois dias, os incidentes noturnos são cada vez mais raros, mas eles ainda criam essa paranoia que impede uma volta à normalidade. As lojas continuam fechadas, em sua maioria. Os poucos bancos abertos só permanecem assim por algumas horas. A maioria dos funcionários não recebe há mais de três meses. E os combatentes civis continuam a percorrer as ruas, passando a imagem de uma evidente desorganização.
      Mas, acima de tudo, talvez seja a incapacidade dos opositores de Muammar Gaddafi em instalar um contrapoder eficaz e transparente que mais cause preocupação, ainda latente entre os rebeldes, mas cada vez mais perceptível além das fronteiras.
      Divergências no comitê
      O Comitê Nacional Transitório, assembleia de cerca de trinta pessoas criada nos dias que se seguiram à insurreição de 17 de fevereiro, e que deveria dirigir o país enquanto se espera a queda do Líder, não conseguiu imprimir sua marca. Somente um terço de seus membros revelou sua identidade. Os outros, originários de cidades onde a influência das tropas leais a Gaddafi ainda é forte, preferiram se manter anônimos por questões de segurança, o que não facilitou as coisas.
      Além de certas tensões e da imprecisão que cercava as atribuições de cada um, era publicamente sabido que o presidente do comitê, Moustapha Abdeljalil, ex-ministro da Justiça, e seu vice, Abdelhafed Ghoga, advogado e militante de direitos humanos que nunca fez parte do regime, não gostavam muito um do outro. Então foi decidido, com incentivo do presidente, que fosse associada ao comitê “uma equipe de crise” de dez pessoas, correndo o risco de complicar ainda mais as coisas.
      “São especialistas encarregados do executivo”, defende-se Moustapha al-Gueriani, um dos porta-vozes do movimento. “Homens que trabalharam por muito tempo no exterior, muitas vezes por razões políticas, e que estão voltando  com seu conhecimento. De agora em diante o Conselho se torna o órgão legislativo”.
      O organograma completo desse novo “governo” foi revelado no sábado (2), em Benghazi. À sua frente está Mahmoud Jibril, um empresário cujo nome já havia aparecido no comitê. Foi ele que, juntamente com Ali al-Essawi, ex-embaixador e agora “ministro” das Relações Exteriores, encontrou o presidente Sarkozy em Paris, no dia 11 de março. Sob sua direção, está Omar Hariri, célebre prisioneiro político, encarregado dos assuntos militares ao lado do general Abdel Fatah Younes, chefe do estado-maior e que havia participado juntamente com Muammar Gaddafi, em 1969, da deposição do rei Idriss.
      A cadeira de “ministro das Finanças” coube a Ali Tarhouni. Professor de Economia nos Estados Unidos, ele voltou à Líbia há um mês depois de 35 anos de exílio. Ele será responsável por recuperar o bilhão de dólares (R$ 1,61 bilhão) impresso por Londres para o governo Gaddafi e que não foi entregue. “Havia ali um vazio total”, ele reconheceu diante de um grupo de jornalistas, na semana passada. “Acho que isso influiu na formação do comitê. Nós iremos mudar tudo isso, eu lhes prometo”. A rebelde Benghazi não espera outra coisa.
      Tradução: Lana Lim

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